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Os desafios de escalabilidade do Blockchain

Blockchains podem escalar e manter seu caráter distribuído?

Introdução

O Blockchain pode ser programado para registrar, verificar e rastrear qualquer coisa com valor, desde registros médicos, mercadorias em cadeias de suprimentos a títulos de propriedade.

A arquitetura blockchain é única, pois revoluciona a maneira como interagimos uns com os outros. E ao contrário do antigo método contábil, sua estrutura foi projetada para ser descentralizada e distribuída em uma extensa rede de computadores. Mas os blockchains atuais são realmente descentralizados, distribuídos? E se efetivamente existirem blockchains decentralizadas, eles são escaláveis?

O que é decentralização?

Protocolos de consenso [1] substituindo uma autoridade central

Um dos aspectos mais empolgantes da arquitetura blockchain é que ela foi projetada para ser inteiramente decentralizada, distribuída.

Devido à natureza distribuída, não existe um ponto único de falha, não existe uma entidade única no controle da rede. Ora, isto torna o sistema mais justo e consideravelmente mais seguro. A maneira pela qual os dados são registrados em um blockchain resume, portanto, uma de suas qualidades mais revolucionárias: a descentralização [2].  Em vez de depender de uma autoridade central para validar transações entre os usuários do sistema, o blockchain utiliza protocolos de consenso para validar transações e registrar dados de uma maneira incorruptível.

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A decentralização e o custo das transações em um blockchain

Como o sistema não depende de uma autoridade central, as taxas normalmente cobradas por essas organizações não são mais um fator. Portanto, as transações no blockchain são mais baratas, já que os únicos custos incorridos pelas partes envolvidas são as taxas nominais usadas para recompensar o minerador ou os participantes que executam um nó na rede.

Eventual “centralização” minaria o propósito do Blockchain

Como garantir segurança, neutralidade política e autenticidade?

Blockchains não efetivamente decentralizados minariam o propósito para os quais foram concebidos. Isto porque, tornaria o protocolo de consenso ineficiente. É a descentralização que garante a segurança, neutralidade política e autenticidade em um blockchain.

O mecanismo de consenso decentralizado traz benefícios, mas hoje prejudica a escalabilidade

Qualquer nó (computador que integra uma rede blockchain) que participe de uma rede com protocolo de consenso público deve processar “todas” as transações. Isso requer um aumento constante do poder computacional e acarreta o risco de centralização.

O grande obstáculo ao potencial inovador dos blockchains é a escalabilidade

O que é escalabilidade?

Quando falamos de escalabilidade, estamos necessariamente pensando em como criar uma rede, com um número crescente de transações, que seja capaz de suportar o aumento de demanda.

O escalonamento do blockchain é um desafio a ser vencido e tem sido uma área ativa de pesquisa há vários anos. Se você tem acompanhado a comunidade Bitcoin nos últimos anos, já deve ter ouvido falar de duas soluções de escala específicas para o Bitcoin, conhecidas como SegWit e o aumento do tamanho do bloco de 2 megabytes (MB).

Ambas as soluções visam resolver o problema específico do Blockchain Bitcoin: seu tamanho rígido de 1 megabyte (MB) por bloco, que limita o número de transações processadas por bloco. Atualmente, o Blockchain Bitcoin, apesar de ter um limite “teórico” de 4.000 transações por segundo, atualmente tem um teto rígido de cerca de 7 transações por segundo para transações pequenas e 3 por segundo para transações mais complexas. Como resultado, o Blockchain Bitcoin vem enfrentando atrasos (às vezes, horas e até dias) no  processamento  e confirmação de transações quando há um aumento de demanda, como o ocorrido no final de 2017.

Da mesma forma, o Blockchain Ethereum também enfrenta limitações em sua capacidade de escalonar.

O limite de gás do Ethereum é um pouco semelhante ao limite de 1 MB do Bitcoin no tamanho de cada bloco, com a diferença de que o limite de gás do Ethereum é dinamicamente definido pelos mineradores, enquanto o limite de tamanho do bloco do Bitcoin é codificado no protocolo. Esse limite de gás para a Ethereum impõe um limite suave na energia computacional da rede por bloco: com o limite atual de 6,7 milhões de gases e a média atual de gás usada por transação padrão de aproximadamente 21K, obtemos aproximadamente 300 transações padrão a cada bloco. O tempo médio de processamento atual é de 20 segundos, o que equivale a aproximadamente 15 transações por segundo (300/20 = 15) na melhor das hipóteses [3].

Ora, isto é muito menos nas transações mais complexas: em torno de aproximadamente 7 transações por segundo [4]. Se observarmos que o número de transações na rede Ethereum está crescendo a um rítmo considerável, percebemos como isto se torna um belo problema.

Diante disto, vejamos a seguir algumas das soluções propostas que estão sendo discutidas na comunidade para solucionar a escalabilidade, sem prejudicar a decentralização.

Como blockchains podem alcançar escala e manter seu caráter distribuído?

Para que o blockchain alcance escala com descentralização, duas direções podem ser tomadas. A primeira delas é melhorar seu protocolo.

Melhorando o protocolo blockchain…

Para que o protocolo blockchain seja aprimorado, é preciso um mecanismo que limite o número de participantes  necessários à validação de cada transação no blockchain. Logicamente, sem perder a confiança de que essa validação seja confiável.

Como exemplos de soluções que estão sendo construídas neste sentido, podemos citar o SegWit (só para o Bitcoin-Blockchain) e o tamanho do bloco de 2 MB (solução só para o Bitcoin-Blockchain).

Caminhando pelas Layer2 Solutions

Outro caminho que se tem adotado para possibilitar a escalabilidade do blockchain (sem prejuízo à descentralização nos mecanismos de consenso públicos), é a “Layer2 solutions” (soluções de segunda camada).

Isto é, usar o blockchain como uma âncora confiável, mas para direcionar a maioria das transações para fora da cadeia.

Como Layer2 Solutions, podemos citar: off-chain state channels, off-Chain computations (Truebit), Lightning Network, Raiden Network, Sharding, Plasma, Counterfactual, bloXroute, entre outros. Vejamos um pouco mais a fundo algumas destas soluções.

Os off-chain state channels são essencialmente um mecanismo pelo qual as interações que poderiam e normalmente ocorreriam dentro de um blockchain, em vez disso, são conduzidas para fora da cadeia. Isso é feito de maneira criptograficamente segura, sem aumentar o risco, proporcionando melhorias significativas no custo e na velocidade.

A Lightning Network é uma rede descentralizada que usa canais de estado por meio de contratos inteligentes
para permitir pagamentos instantâneos e escalonáveis em uma rede de participantes. Inicialmente, a Lightning Network foi criada para o Bitcoin, mas agora parece que eles também permitem transações através de blockchains.

Raiden Network é a analogia Ethereum da rede Lightning. A Raiden também utiliza redes de estado fora da cadeia para estender a Ethereum com transações escaláveis e instantâneas.

Plasma foi introduzido muito recentemente e está entre as soluções propostas mais promissoras para computação escalável no blockchain. O plasma é essencialmente uma série de smart contracts que correm em cima de um blockchain raiz (isto é, o blockchain principal do Ethereum). É uma estrutura escalável que permite o processar de uma quantidade significativa de aplicativos financeiros decentralizados no blockchain.

Truebit é um exemplo de off-chain computations, e é uma solução que usa cálculos fora da cadeia para permitir
transações escaláveis entre os contratos inteligentes do blockchain Ethereum. Essencialmente, o TrueBit usa uma camada fora do blockchain para fazer o trabalho pesado. Em outras palavras, é um sistema que executa verificadamente cálculos off-chain (fora da rede). Do contrário, tais cálculos seriam proibitivamente custosos se fossem executados na rede.

O “help” das soluções indiretas

Ainda, há outras soluções indiretas, que embora não pretendam solucionar a escalabilidade diretamente, ajudam a resolver indiretamente alguns de seus problemas. Como exemplo, podemos citar:  proof of stake [5], blockchain rent [6], armazenamento decentralizado, dentre outros.

Mas como o proof-of-stake [7] pode ajudar na escalabilidade? Dividindo a responsabilidade de validação entre muitos nós [8] para que cada nó não precise processar todas as transações que ocorrem no blockchain. Outra razão pela qual o proof-of-stake ajuda indiretamente a escalabilidade no blockchain ethereum é porque os validadores ganham apenas taxas de transação. Diferentemente da prova-de-trabalho que emite novos tokens como recompensa aos mineradores que validam os blocos.

De outro lado, o blockchain rent é uma solução específica do Ethereum que visa reduzir a quantidade de dados armazenados na rede para ajudar a acelerar o tempo das transações [9]. O blockchain rent propõe definir o custo de armazenamento como ‘bytes x tempo’. Dessa forma, há um incentivo embutido no protocolo para manter a rede mais leve e reduzir os tempos de transação.

Por fim, outra solução indireta para a escalabilidade é usar um serviço de armazenamento descentralizado como o Swarm, para manter a rede mais leve. Swarm [10] é um protocolo de compartilhamento de arquivos peer-to-peer para Ethereum que permite armazenar código de aplicativo e dados do blockchain principal em nós de swarm. Estes são conectados ao Ethereum, e em vez de armazenar todos os dados transacionados no blockchain, armazenam apenas aqueles requisitados com mais frequência. Os demais dados são armazenados na “nuvem” via Swarm.

Uma perspectiva promissora

Embora nenhum dos caminhos acima torne os blockchains escaláveis hoje, tais soluções tem ajudado a melhorar a escalabilidade dia-a-dia. E certamente, nos traz uma perspectiva promissora para que as redes tornem-se escaláveis num futuro próximo.

E com isto, alcançamos o objetivo deste artigo. Cuidamos da importância da descentralização e exploramos um pouco do que têm sido desenvolvido para solucionar a escalabilidade.

Sugestões e comentários são sempre bem-vindos. Nos encontramos em breve!

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[1] Um mecanismo ou protocolo de consenso é um conjunto de regras que descreve como funciona a comunicação e transmissão de dados entre dispositivos eletrônicos. O consenso é alcançado quando dispositivos suficientes concordam sobre o que é verdadeiro e o que deve ser registrado no blockchain. Portanto, os protocolos de consenso são regras para que dispositivos espalhados pelo mundo cheguem a um acordo. É isto que permite uma rede blockchain funcionar sem ser corrompida. [2]  Descentralizado significa que não existe um único ponto de falha, não existe uma entidade única no controle da rede. O termo distribuído refere-se ao blockchain em si. Relaciona-se como cada nó que está sincronizado com o blockchain possui uma cópia do ledger. [3] Observe que essas limitações não existem para blockchains privados. Uma rede privada pode garantir que cada computador da seja de alta qualidade com rápida conexão à internet. Atualmente, escalar o blockchain exigiria que adicionássemos mais computação a cada nó para que a rede ficasse mais rápida. Como as redes gerenciadas de forma privada controlam todos os nós da rede, elas podem fazer isso [Kasireddy, Preeti. In: Blockchains don´t scale not today at least, but there is hope, Medium, 2017). [4] https://etherscan.io/chart/gaslimit [5] https://github.com/ethereum/wiki/wiki/Proof-of-Stake-FAQs#what-is-proof-of-stake [6] https://github.com/ethereum/EIPs/issues/35 [7] O proof of stake é um dos protocolos de consenso que dá a segurança a rede, impedindo a duplicação. Em blockchains tradicionais baseados em proof-of-work, os mineradores mantêm a integridade dos dados da rede. Ao competirem para resolver enigmas matemáticos de computação em troca de recompensas, eles validam as transações com sua potência computacional. Logo, quanto maior a força computacional dos mineradores, maior sua capacidade de influenciar a rede.  Já no proof-of-stake, as partes interessadas votam com suas criptomoedas, em vez de usar seu poder computacional. [8] dispositivos computacionais que integram a rede [9] No Ethereum, os usuários pagam por etapas computacionais, memória, logs de transação e armazenamento permanente. Enquanto a maioria destes recursos são pagos de forma devidamente incentivada, o armazenamento não é. No sistema atual, os usuários pagam apenas por bytes de armazenamento. No entanto, fato é que o armazenamento difere dos outros recursos porque ele é armazenado permanentemente nos blocos. [9] https://ethereum.stackexchange.com/questions/375/what-is-swarm-and-what-is-it-used-for
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Tatiana Revoredo

Blockchain Strategist pela University of Oxford, e pelo MIT - Massachusetts Institute of Technology. Liason do European Law Observatory on New Technologies. Atualmente cursa Cybersecurity em Harvard. Convidada pelo Parlamento Europeu para Conferência Intercontinental sobre aplicações Blockchain e regulação de criptomoedas e ICOs. Participou do 1st Annual Crypto Finance Conference, do Fórum Econômico Mundial e Forum Mundial da Internet. Apaixonada por jazz e harley davidson.

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