Categorias Notícias

Entenda dois vieses cognitivos que levam gestores a falarem inverdades sobre o Bitcoin

Um alto executivo de uma grande corretora que esquece como se faz divisão. Um analista que fala de alguém desconhecido sem conhecer o que ele criou. E alguém que chama de bolha um ativo que nunca analisou.

E de repente, sai algum tipo de desinformação sobre criptomoedas em geral, e especialmente sobre Bitcoin (BTC)

Muitas das críticas feitas pelo mainstream ao BTC já foram amplamente refutadas como erros claros. E mesmo assim, por que analistas continuam espalhando desinformação?

Esse comportamento pode ser explicado por dois vieses cognitivos bastante conhecidos: o ultracrepidanismo e o efeito Dunning-Kruger. No texto de hoje você conhecerá o que são esses efeitos e como eles explicam esses comportamentos.

🚀 Buscando a próxima moeda 100x?
Confira nossas sugestões de Pre-Sales para investir agora

Ultracrepidanismo

A cena se repete frequentemente na Internet. Um gestor ou analista com boa formação acadêmica, notadamente inteligente. Essa pessoa entende de ações e outros investimentos como ninguém e, em momentos de crise ou euforia, concede diversas entrevistas.

Em um determinado momento, o assunto BTC vem à tona. O gestor, que admite não ter a criptomoeda em seu portfólio, resolve dar sua opinião. Esta opinião repercute de forma negativa, pois contém um tom de desinformação sobre como funciona o mercado de BTC.

O ato de uma pessoa emitir opiniões sobre assuntos dos quais não entende possui um nome específico: ultracrepidanismo. Especificamente, o conceito refere-se ao “hábito de expressar opiniões ou dar conselhos em assuntos para além do conhecimento do próprio”.

A palavra surgiu da aglutinação de dois termos em latim: “ultra” e “crepidam“, que juntos singnificam “não vá além da estrada”. De fato, sua origem está na expressão latina “Sutor, ne ultra crepidam“, que significa “sapateiro, não vá para além da sandália”.

Em outras palavras, a frase é equivalente ao ditado popular “não dê um passo maior do que a perna”. Mas enquanto o ditado brasileiro se refere a ações, a expressão em latim fala de palavras. O ditado é uma forma de desencorajar um indivíduo de falar além da sua área de conhecimento.

Luís Vabo, empresário e CEO da Reserve Systems, sintetizou de uma forma clara o ultracrepidanismo como um produto dos tempos atuais. Com o advento das redes sociais, o sucesso de uma pessoa passou a ser definido não pelas suas competências, mas sim pela quantidade de seguidores.

Isso significa que os chamados “especialistas” de hoje não podem apenas falar sobre suas áreas, mas sim gerar engajamento. E se falar de criptomoedas e BTC faz seu nome ganhar destaque, então este será o assunto – mesmo que a informação passada esteja totalmente equivocada.

“Hoje em dia o que vemos são generalistas especializados em absolutamente tudo e, diferentemente de épocas anteriores, essas pessoas não buscam ser valorizadas pelas empresas, mas pelos seus seguidores”, afirma Vabo.

Engajamento requer postura “ativa”

Foi o que de fato aconteceu no caso de Tiago Reis, analista de investimentos e fundador da Suno Research. Ao especular que Satoshi Nakamoto, criador do BTC, estaria “vendendo suas moedas”, Reis naturalmente desinformou seus ouvintes. E ganhou um enorme engajamento por isso.

Uma pesquisa rápida na blockchain, de acordo com dados, indica que Satoshi possui cerca de 900 mil a 1 milhão de BTC. Todas essas moedas foram adquiridas entre 2009 e 2010, ano que ele desapareceu para sempre. Outras foram dadas como doações de fãs e entusiastas, que resolveram agradecer a Nakamoto pela criação revolucionária que ele deu ao mundo.

No entanto, absolutamente nenhum satoshi foi gasto por ele durante este período. Uma das poucas transações de saída foram os 10 BTC que Satoshi enviou para Hal Finney em 2009. Esta foi a primeira transação da história do BTC, mas ocorreu quando a criptomoeda sequer tinha valor.

Bastava uma simples pesquisa no Google – um ato trivial para alguém que se orgulha de ser um ávido leitor – e essas informações estariam disponíveis. No entanto, o ultracrepidanismo falou mais alto e de fato rendeu mais frutos. Afinal, o curto vídeo onde Reis fala sobre Satoshi rendeu-lhe uma enorme repercussão, sobretudo no Twitter.

O efeito Dunning–Kruger

Além do ultracrepidanismo, existe outro viés cognitivo que leva as pessoas a cometerem erros em suas análises. Este viés é o efeito Dunning–Kruger, chamado assim em homenagem aos dois professores de psicologia americanos, David Dunning e Justin Kruger, que investigaram o fenômeno.

O efeito em si é natural da espécie humana, mas ganhou seu nome oficial apenas em 1999. Ele foi descoberto durante um teste aplicado pelos dois psicólogos, que envolvia responder perguntas de lógica e gramática.

Ao final do teste, e antes de revelarem os resultados, os pesquisadores pediram às pessoas para avaliarem suas próprias performances. Em seguida, revelaram os resultados, que surpreenderam muita gente.

Os voluntários que ficaram melhor classificados foram aqueles subestimaram seus resultados. Já os que erraram mais perguntas foram os que mais superestimaram sua capacidade. Em suma, os candidatos mais fracos achavam que sabiam mais do que aqueles que de fato foram melhor.

Dessa forma, Dunning e Kruger identificaram um conceito que hoje se tornou popular na seguinte frase: quanto menos uma pessoa sabe, mais ela vai achar que sabe. Esse excesso de conhecimento também explica o fato de gestores opinarem sobre o que não entendem, achando que de fato estão gerando conhecimento.

O erro crasso de divisão

Um exemplo parcial de um efeito Dunning–Kruger ocorreu com Fernando Ferreira, estrategista-chefe da  XP Investimentos, maior corretora do Brasil. Em 2021, Ferreira lançou a seguinte pergunta através do seu perfil no Twitter:

“Se 1 BTC pode ser fracionado em até 100 milhões de partes (a menor fração do BTC), a teoria de oferta limitada seria quase uma falácia? Pois com 21 milhões de BTC, na verdade existirão 2.100,000,000,000,000 (2 quatrilhões) de satoshis. Oferta suficiente será?”

Aparentemente era uma pergunta inocente, que somente revelava uma má compreensão da divisibilidade do BTC. Ferreia recebeu várias respostas que apontavam o erro nesse sentido, sendo uma delas a seguinte:

Nesse caso, há uma clara falta de compreensão sobre a divisibilidade do BTC, mas que é contrabalançada pelo conhecimento do gestor em outras áreas. Com isso, ele acabou falando, especificamente neste caso, mais do que ele sabia sobre um assunto do qual aparentemente não entende.

Sim, o BTC pode ser dividido em até 100 milhões de satoshis, o que multiplicado pelos 21 milhões de BTC dá uma oferta total de 2,1 quatrilhões de satoshis. Mas isso não transforma cada satoshi em BTC. A divisão não significa expansão monetária, mas apenas uma repartição.

É como pedir uma pizza de um metro e resolver dividi-la em várias fatias. Não importa se você escolhe uma divisão em três, dez ou 200 fatias, o tamanho da pizza continuará sendo de um metro. Nesse sentido, a divisibilidade da pizza não faz com que ela não seja escassa.

Para finalizar, a ideia de que todo ser humano pode se superestimar não pode ser ignorada. Afinal, ela certamente leva até os mais inteligentes a cometer erros básicos em suas análises. Nos tempos de exposição digital, querer mostrar mais conhecimento do que tem é algo normal. A verdadeira ignorância é insistir no erro e não buscar conhecimento nas amplas fontes disponíveis.

Leia também: Vitalik Buterin condena operação da Rússia na Ucrânia: Crime contra o povo

Leia também: Empresa recupera e devolve três NFTs roubados em ataque ao OpenSea

Leia também: Warner Music foca em jogos play-to-earn em parceria com Splinterlands 

Compartilhar
Luciano Rocha

Luciano Rocha é redator, escritor e editor-chefe de newsletter com 7 anos de experiência no setor de criptomoedas. Tem formação em produção de conteúdo pela Rock Content. Desde 2017, Luciano já escreveu mais de 5.000 artigos, tutoriais e newsletter publicações como o CriptoFácil e o Money Crunch.

This website uses cookies.