O Deputado Federal Vinicius Poit (NOVO / SP) é um dos deputados que vem atuando para mostrar a importância da blockchain e das criptomoedas no cenário nacional e, recentemente, sugeriu, por meio do requerimento 33/2019 CCTCI destinado à Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), que a tecnologia blockchain deve ser considerada nos debates da Reforma Tributária proposta pelo governo do presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da economia Paulo Guedes.
Em uma entrevista concedida ao CriptoFácil, o deputado revelou que vê um potencial inovador nos criptoativos e destacou como a blockchain pode ajudar o Brasil a melhorar sua arrecadação de impostos. Além disso, Poit também mostrou como a atuação em conjunto com outros colegas, como o Deputado Federal Alexis Fonteyne (NOVO/SP), pode ser fundamental para ajudar a movimentar o tema na Câmara dos Deputados. Confira!
CriptoFácil: Qual é o objetivo do requerimento e como você entende a importância da blockchain na reforma tributária?
Vinicius Poit: Para responder esta questão precisamos entender o que está por trás. A discussão da reforma tributária pode ser subdividida em seis diferentes batalhas* (*destaques feitos pelo deputado)
A primeira é a da carga tributária – ou quanto quem trabalha, empreende e produz deverá pagar ao governo? Essa é uma discussão casada com a questão das despesas. É muito difícil reduzir a carga com o país gastando mais do que arrecada.
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A segunda é a da composição tributária. Hoje no Brasil tributa-se principalmente a circulação de mercadorias e serviços afetando principalmente os mais pobres –44%. Nos EUA prevalece impostos sobre a renda, na França sobre o trabalho.[1] Como é o melhor cenário para o Brasil crescer? De onde deve vir o dinheiro arrecadado: das indústrias, dos serviços, do setor financeiro?
A terceira é a complexidade tributária – quão difícil deve ser pagar os impostos? Quão rígidas devem ser as obrigações acessórias? Hoje o brasileiro gasta 1.958 horas ao ano para quitar todas as suas obrigações tributárias. O tempo é seis vezes a média de 332 horas registrada nos países da América Latina e Caribe.
Uma quarta batalha, muitas vezes esquecida, diz quanto à visibilidade tributária: 45% dos brasileiros não sabem que paga impostos ao ir às compras. O brasileiro médio percebe bem mais a incidência de impostos lançados de ofício, como os boletos do IPTU e IPVA, do os tributos indiretos, diluídos nas mercadorias. Essa é uma questão filosófica, mas também prática. O brasileiro se sente mais imbuído de poder quando sabe que é ele que paga a conta.
A quinta diz quanto à justiça tributária: as alíquotas devem ser “flat“, regressivas, progressivas? Ou mais que isso: é justo existir isenções por setores? É provável que setores mais organizados politicamente tenham mais benefícios e outros menos organizados sejam mais prejudicados. Como evitar isso?
A sexta e mais complicada das batalhas diz quanto à destinação tributária. Essa questão envolve a discussão do pacto federativo, mas sua maior complicação é que ela vem escondida na composição dos tributos. Como nossa constituição predefine os repasses de cada tributo a determinados órgão federativos, é comum que se confunda a defesa do ICMS à defesa de repasses para os estados, de ISS à defesa de repasses para os municípios e por aí vai.
Por que estou falando isso? Em primeiro lugar, a batalha mais consensual que temos hoje é a da complexidade tributária. O uso de aplicações baseadas em blockchain garante a autenticidade de informações e pode servir de ferramenta para simplificação do cumprimento de obrigações acessórias. Em segundo lugar, o setor industrial tem vencido sistematicamente as batalhas da composição e justiça tributária, garantindo além de incentivos e isenções, alíquotas menores que as do setor de serviços. Se quisermos garantir o Brasil na vanguarda da economia digital, precisamos uma composição e complexidade tributária compatível com os nossos objetivos.
CF: Há uma estratégia na apresentação do mesmo requerimento por dois deputados diferentes?
VP: Essa é uma questão relativamente simples. Meu colega de bancada, deputado Alexis Fonteyne (NOVO-SP) é membro da Comissão Finanças e Tributação (CFT). Eu sou membro da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCCTCI). A discussão sobre novas tecnologias e reforma tributária deve estar alinhada nas duas comissões.
CF: O Governo Federal vem adotando blockchain em diversos projetos e serviços do Governo. Como você vê este processo e se acredita que também dentro da Câmara dos Deputados, a blockchain pode ser usada para modernizar serviços?
VP: Nós vivemos em um mundo em que pessoas – ou máquinas – trocam dados e celebram contratos com terceiros anônimos em jurisdições desconhecidas utilizando plataformas construídas em códigos de computador. Como viabilizar contratos sobre os quais sequer se conhece a jurisdição em que gerará efeitos? Como garantir acordos em relações instantâneas ou descontinuadas? Como assegurar confiança em uma relação machine-to-machine ou mesmo entre anônimos? A blockchain parece uma excelente solução para infindáveis problemas. Mas ainda precisa amadurecer em alguns pontos. É sempre bom lembrar o trilema da escalabilidade que estabelece que sistemas baseados em Blockchain só podem ter duas das três propriedades: segurança, descentralização e escalabilidade. O que quero dizer? Sim, podemos aplicar blockchain em várias soluções. Mas também não é prudente agir de forma prematura ou tratar como a solução para todos os problemas de maneira leviana.
CF: Dois projetos do deputado Aureo pretendem estabelecer regras para este mercado. Você acredita que o Bitcoin deve ter uma regulamentação no Brasil?
VP: O mercado de criptoativos tem crescido no mundo todo e o Brasil não pode ficar para trás. Setores inovadores sempre vão estar à frente dos reguladores e é natural que continue assim nesse tema. No entanto, para usuários, investidores e operadores sempre é interessante um arranjo normativo que lhes dê segurança, mas ao mesmo tempo que não inviabilize o desenvolvimento desse mercado. Que tipo de regulação melhor se encaixa ao cenário brasileiro ainda não sabemos, e justamente por esse motivo precisamos amadurecer o debate, ouvir todos os atores envolvidos: empresas, agências reguladoras, parlamento, sociedade civil.
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