Um batalha entre equipes de desenvolvedores do Bitcoin Cash (BCH) pode culminar na divisão da blockchain e na criação de uma nova criptomoeda. No entanto, diferente de outros hard forks, como o que aconteceu no ano passado e gerou a criação do próprio BCH, neste caso, há uma guerra literalmente declarada, com um dos lados afirmando querer eliminar por completo o outro, criando inclusive “armas” para executar este fim.
O hard fork na rede do Bitcoin Cash acontecerá nesta quinta-feira, dia 15 de novembro, no timestamp UNIX 1524300000, às 4:40 PM UTC. No Brasil, o evento acontecerá nesta quinta feira às 14h40. Apesar das proteções contra replay que já estão implementadas nas atualizações, é incerto como as blockchains irão se comportar diante do evento, por isso, o Criptomoedas Fácil elaborou um pequeno guia para você entender o caso e proteger seus ativos.
Entenda o caso
Como mostra o desenvolvedor Nikolas Goline, um fork nada mais é do que uma bifurcação (Y), uma divisão ou separação de alguma coisa em dois ramos ou braços, uma forquilha. Exitem, basicamente, três tipos de forks, mas, no caso dos hard forks, as atualizações propostas devem sem implementadas para que o software continue funcionado, caso contrário, haverá uma divisão na rede entre os que realizaram a atualização e permanecem na cadeia atualizada e aqueles que não fizeram a atualização e ficam com a cadeia antiga.
No caso do Bitcoin Cash (que tem uma política de realizar um fork a cada seis meses para atualizar o protocolo), uma equipe de desenvolvedores, denominada Bitcoin ABC (que seria o cliente “original” do BCH), propôs uma série de mudanças (versão 0.18.0), como o “Pedido de Transação Canônico” (CTOR), que pode oferecer benefícios técnicos, em parte relacionados a (futuras) melhorias de escala.
Além dela, outras mudanças são propostas como uma nova peça de script (um “código OP”) chamado OP_CHECKDATASIG (DSV) que permite a validação de mensagens fora da blockchain e também oráculos (que permitem uma classe de contratos inteligentes), melhorias de escalabilidade e outras várias pequenas correções técnicas.
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“Nosso objetivo é trabalhar no melhor interesse de mineradores, investidores e usuários do Bitcoin Cash, e colaborar e coordenar com outras equipes e projetos no ecossistema do Bitcoin Cash. O Bitcoin ABC 0.18.0 cresceu deste processo colaborativo. Ele implementa recursos de atualização de rede desenvolvidos com entrada e colaboração de vários grupos diferentes. É um passo importante no processo de um progresso técnico cuidadoso e incremental para melhorar a utilidade do Bitcoin Cash e permitir um dimensionamento massivo na cadeia”, disse a equipe do Bitcoin ABC.
Porém, a proposta de atualização não encontrou consenso e liderada pelo controverso empresário das criptomoedas Craig Wright, da nChain, que já chegou a se autointitular de Satoshi Nakamoto, uma divisão na cadeia foi iniciada. Wright não concorda com as implementações da equipe ABC e, em seu lugar, propõe implementar outras mudanças como blocos de 128MB; reintrodução dos chamados “opcodes Satoshi” – OP_MUL, OP_INVERT, OP_LSHIFT e OP_RSHIFT – e mais que o dobro do número máximo de opcodes por script para 500 de 201. Wright lançou a versão 0.1.0 do SV no GitHub.
Com o Bitcoin Satoshi Vision (Bitcoin SV), Wright diz que quer restaurar o Bitcoin ao seu protocolo original e, desta forma, rejeita a CTOR, pois a nChain acredita que os benefícios em potencial são insuficientemente provados e os riscos são muito altos. O DSV (OP_CHECKDATASIG), será desmontado. (Wright chega a afirmar que a DSV tornaria o Bitcoin ABC e seus mineradores ilegais).
No Bitcoin SV, as moedas mantidas em “endereços DSV” provavelmente serão convertidas em doações para mineradoras. Transações P2SH (o que permite muita flexibilidade de transação e foi introduzido em 2012 no Bitcoin) será depreciado. Além disso, o cientista-chefe da nChain disse que vai trazer as moedas “perdidas” de volta à circulação.
A Guerra
A divisão da blockchain entre ideias de atualização ganhou, literalmente, de uma guerra civil com ambos lados trocando farpas e acusações pelas redes sociais, até que Wright decidiu partir para o ataque e “aniquilar” o BCH por meio de um ataque de mineração e, em parceria com a startup CashPay Solutions, que abriu um pool de mineração SharkPool, lançou como único objetivo do pool reunir hashate para atacar altcoins e garfos no BCH que considera ilegítimos e, atualmente, seu principal alvo é a proposta de atualização do Bitcoin ABC.
“O SharkPool considera todas as alterações no design original do Bitcoin uma ameaça, isso inclui uma potencial cadeia ABC se eles decidirem não apoiar a tempo e aceitar o conjunto de regras do SV (Satoshi Vision) antes do hard fork”, disse o cofundador Ari Kuqi em um comunicado.
Além de Wright, a proposta de divisão na cadeia do BCH e a “criação” do Bitcoin SV tem apoio institucional e financeiro da CoinGeek, empresa de criptomoedas fundada pelo bilionário Calvin Ayre. A CoinGeek opera o segundo maior pool de mineração de Bitcoin Cash e atualmente responde por cerca de 26% dos blocos do BCH extraídos nos últimos sete dias. O SVPool, que recentemente foi lançado pela nChain através de um beta privado e ainda não foi aberto ao público, representa mais 3,5% do hashate. No total, segundo estimativas, de acordo com dados do Coin Dance, a união dos pools em torno do SV (CoinGeek, SVPool, BMG Pool, okminer e mempool), representaria pelo menos 73% da taxa de hash da rede BCH. O que, em tese, se confirmado após o fork, significaria que a atualização proposta pelo Bitcoin SV provavelmente seria a cadeia BCH “original”.
No entanto, a conta de hash não é tão simples e a posse do ticker BCH depende de outros fatores. O poder de hash de um pool também depende de outras variantes, a principal delas diz respeito aos usuários destes pools que podem optar por não direcionar seus equipamentos para a cadeia que o pool apoia e, portanto, “levando” seu poder de hash para a outra cadeia.
Na equipe ABC, por outro lado, para impedir este tipo de ataque o desenvolvedor Amaury Séchet, intitulado o ‘ditador benevolente’ do Bitcoin ABC, declarou que, no caso de ataque real da equipe de Wright é preciso ter, como opção um path de atualização pronto para poder trocar o algorítimo de consenso da criptomoeda, no caso o proof-of-work (PoW). Mas, nem Séchet tem convicção desta mudança, considerada por ele muito perigosa, mas que seria “o único recurso, uma especie de arma nuclear” para evitar a destruição da moeda, lembrando que uma mudança repentina de PoW, pode abrir brechas para ataques de outras formas, como gasto duplo.
“É melhor estar pronto e não precisar dele [do path] do que precisar e não estar pronto. Mudar o PoW é uma opção nuclear, desta forma eu tenho preocupações e relutância em fazê-lo, temos que levar isso em consideração como ultimo recurso, afinal, no caso de um ataque de mineração hostil, temos que estar prontos”, disse.
Como se proteger
Devido a todo este cenário e para assegurar os fundos de seus clientes a maioria das exchanges, wallets, provedores de pagamento e empresas que trabalham com Bitcoin Cash vão suspender os depósitos e retiradas dos usuários antes do fork e anunciaram que só irão retomar os serviços após a estabilização das redes. No entanto é preciso estar atento pois, como haverá divisão na blockchain isso implica em que sera o dono do “nome” e do “ticker”. Nesse caso, o Bitcoin ABC parece receber o nome “Bitcoin Cash” e o ticker “BCH”, mas isso pode diferir de um serviço para outro. Para prevenir este tipo de situação é preciso verificar com cada serviço o suporte que será dado, tirar um snapshot de seu saldo e decidir o que fazer: mover os fundos ou aguardar.
Importante ressaltar que se você possui e controla suas chaves privadas, não faça qualquer transação durante o fork nem após ele, até que as redes estejam estáveis e a salvo de transações cruzadas. Neste momento, talvez não seja indicado “buscar” o saldo na nova cadeia, é mais recomendado aguardar e acompanhar o movimento para preservar os fundos.
Existe ainda um outro cenário, que resultaria na criação de mais uma outra criptomoeda (uma terceira divisão, que não suportaria nem o Bitcoin ABC nem o Bitcoin SV), ou então uma nova “criptomoeda” que seja compatível com ambos, mas estes cenários parecem improváveis ou temporários na melhor das hipóteses e provavelmente não são algo que vale a pena se preocupar por enquanto. Mas isso reforça a preocupação em não mover qualquer Bitcoin Cash durante ou logo após o fork.