Tallinn, capital da Estônia, é uma cidade medieval que lembra os cenários de inúmeras séries e livros que tem seu enredo na Europa antiga. Diferente de São Paulo, em que carros e pessoas dividem os espaços em fluxos intermitentes, aqui as ruas são quase desertas e é possível até ouvir sons muitas vezes estranhos à “floresta de concreto e aço”, como vento, pássaros e até mesmo das folhas secas das árvores, mas a noite, mesmo com o ar gelado, as ruas ganham outras cores e outros sons quando as pessoas saem para todos os cantos em busca de diversão, uma agitação que contrasta com a calmaria do dia.
Foi em um destes encontros noturnos que descobrimos que para entender o desenvolvimento da blockchain na Estônia é necessário olhar um pouco mais os detalhes, mais especificamente no X-Road, um backbone de código aberto no qual toda a infraestrutura digital do país é executada.
Ela foi colocado em prática já em 2001 e está enraizada em uma blockchain chamada K.SI, que foi desenvolvida pela Guardtime, uma das maiores empresas de blockchain do mundo. Para se ter uma ideia do potencial do K.SI da Guardtime, ela é usada pela OTAN e pelo Departamento de Defesa dos EUA.
“Esse é o ambiente invisível, mas crucial, que permite que os vários bancos de dados de e-service do país, tanto no setor público quanto no privado, se unam e operem em harmonia, economizando mais de 800 anos de trabalho para o estado e para os cidadãos anualmente”, diz o site oficial do e-Estonia sobre a aplicação.
A principal inovação na X-Road, ao mesmo tempo em que dá às pessoas mais controle sobre seus dados e desonera uma autoridade central para controlar esses dados, permite a interação com diferentes atores, por exemplo, professores podem inserir marcas acadêmicas no registro de alguém, mas não podem acessar seu histórico médico, por outro lado, médicos têm acesso ao histórico de seus pacientes, mas não seus dados financeiros.
Na X-Road estão dados relacionados a impostos, registros médicos, registros de votação, identidades digitais, informações de residência, entre outros. Ter estes dados públicos armazenados com segurança em uma blockchain garante (entre outras coisas) que a Estônia nunca sofrerá o mesmo destino que o Haiti (cujos registros de terras foram eliminados por um terremoto de 2010, deixando as pessoas sem a segurança jurídica da posse de suas propriedades).
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Quase todos os 1,3 milhões de cidadãos do país têm um cartão de identificação digital, que funciona muito mais do que o nosso velho e surrado RG, que temos que renovar de 10 em 10 anos e cujo o maior desenvolvimento até hoje, perceptível ao cidadão, foi, no Estado de São Paulo, a possibilidade de “emitir”o documento no Poupa Tempo.
Na Estônia, esse ID usa uma criptografia de chave pública de 2048 bits e permite que uma pessoa tenha acesso a inúmeros serviços, eliminando a necessidade de preenchimento de formulários de KYC, afinal, por meio de um sistema de permissões, todos os seus dados estão ao mesmo tempo disponíveis e em seu controle. Para aqueles que pensaram numa 25 de março digitalizada fornecendo ID digitais falsificados, a Estônia já vem trabalhando para evitar este tipo de fraude e tem hoje uma equipe de pesquisadores de segurança monitorando problemas como esses, tendo atualizado recentemente os IDs para criptografia de curva elíptica, que é mais segura e mais rápida do que os certificados SSL usados anteriormente e, até o momento, não houve registro de uso indevido de uma identidade digital.
Aqui na Estônia, o medieval convive com o tecnológico, um exemplo para o mundo de que, não importa o tamanho ou a história de uma país, não há limites para a inovação quando um povo e um governo decidem que é hora de revolucionar o mundo.